Existem benefícios em meio às incertezas dos fertilizantes?
O Brasil é responsável em média por 8% do consumo global de fertilizantes. E embora seja um país com potencial para em breve responder por quase metade da produção mundial de alimentos, importa 85% dos seus fertilizantes. Isso faz com que crises internacionais como a atual guerra Rússia x Ucrânia, os gargalos logísticos, o aumento do petróleo, a cotação do dólar e mesmo a crescente demanda de fertilizantes sejam extremamente sentidas no nosso país.
Os fertilizantes ajudam o Brasil a ser e a se manter como líder mundial em produtividade agropecuária. E compreender as melhores práticas a serem adotadas em campo, os potenciais benefícios de novas cadeias emergentes como organominerais, subprodutos e bioinsumos e os incentivos e desafios atuais para investimentos e desenvolvimento internos são ferramentas fundamentais para garantir sucesso ao agro brasileiro no curto e longo prazo.
Entender que momentos conturbados podem trazer consciência e benefícios, e que mitigar os riscos fortalece e impulsiona a competitividade, é tão importante quanto demonstrar de maneira prática e imediata aos produtores como sobreviver às dificuldades de preços e ofertas atuais, sem que comprometam sua produtividade no campo.
E como toda crise gera uma oportunidade, nós, do PDG Brasil, conversamos com o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), a ANDA (Associação Nacional para Difusão de Adubos), a Yara e a Fundação Procafé para entender quais são os aprendizados e as iniciativas decorrentes do aumento nos preços e difícil acesso aos fertilizantes, no intuito de coletar orientações de como os produtores e o Brasil podem se fortalecer e prosperar em meio às adversidades.
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Fertilizantes ou adubos?
Fertilizantes e adubos são sinônimos. Eles conferem propriedades semelhantes às plantas e têm o objetivo de corrigir o solo e nutrir a planta, para que com isso se alcance uma melhor produtividade no campo. Podem ser:
- Orgânicos – resultantes da geração de energia, produção animal e alimentos,
- Minerais – derivados de produtos de origem mineral natural.
A nutrição do solo e da planta são de extrema importância, sendo fundamental entender quando e qual a nutrição necessária para cada ambiente agrícola. O solo necessita de correção e adubação, mas também possui reserva de nutrientes e, portanto, enquanto a falta de nutrientes retarda a produtividade, o excesso, além de ser desnecessário e caro, pode causar desequilíbrios e consequentemente ser prejudicial à produção. Sendo assim, é crucial a identificação da adubação apropriada para garantir boa produtividade e o melhor custo benefício para as lavouras.
Essa identificação pode ser feita de diferentes maneiras, sendo as análises de solo e foliar, escolhas acessíveis e efetivas para a maioria das culturas. Com elas, é possível identificar o que se tem no solo, local em que a planta vai buscar os nutrientes, como também o que já existe dentro da planta. Isso auxilia o produtor e a produtora no planejamento e na adoção de adubações e correções, que além de evitar excessos, garantem um uso mais eficiente e consequente economia na compra dos fertilizantes.
Para Ricardo Tortorella, diretor-executivo da ANDA, nenhum solo absorve integralmente os nutrientes, e a ciência mostra que no solo brasileiro, que é um solo tropical, a perda natural na absorção dos nutrientes é ainda superior. Fortalecendo, portanto, a importância de se conhecer periodicamente as necessidades do solo e da planta.
Para Luis Eduardo Rangel, diretor de Programas da Secretaria Executiva do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), apesar de o agricultor brasileiro apresentar excelência produtiva reconhecida mundialmente, alguns diagnósticos internos demonstram que a maioria dos produtores ainda carecem de assistência técnica para a utilização adequada dos fertilizantes.
‘’Portanto além de perda natural, os produtores também se deparam com potencial desperdício, que pode chegar até a 40%, devido a ajustes de maquinário ou mesmo fatores decorrentes da falta de análises e instruções adequadas.’’
Para João Moraes, diretor de contas globais da Yara, a extensão rural associada à melhor organização dos dados de preços, custos, manejos e indicadores de produtividade ao longo do tempo resultará em maior domínio do conhecimento “porteira para dentro” e ampliação dos resultados do produtor rural.
É importante ressaltar a importância de uma análise efetiva da relação custo-benefício para qualquer decisão produtiva. Pois, embora o Brasil já tenha efetivado sua revolução agrícola e incorporado fertilizantes e maquinários modernos e eficientes à sua agricultura, o acesso ainda não é democrático, ou seja, não atende a todos os produtores ou todas as culturas, e, portanto, os custos ainda apresentam significativo potencial de redução.

Nutrição e sustentabilidade
Com o intuito de vencer os gargalos com potencial falta de fertilizantes minerais e alta nos preços, somadas às preocupações com as mudanças climáticas e novas metas de sustentabilidade corporativas, a saúde do solo vem a cada dia conquistando mais espaço e possibilitando que novas técnicas e novos produtos participem e agreguem ao agronegócio.
Para Alysson Vilela Fagundes, engenheiro agrônomo pesquisador da Fundação Procafé, o organomineral é a mistura de qualquer fertilizante orgânico com fertilizante mineral. Existem diferentes classes, que se diferem de acordo com o material de origem da parte orgânica do organo.
Para ele o agronegócio brasileiro está muito avançado nesse quesito, e na cafeicultura não é diferente, sendo possível encontrar produtos que variam de ótima a péssima qualidade, ressaltando a importância da boa avaliação pelo produtor.
Rangel reforça que os organominerais são estratégicos, já que o Brasil tem muito potencial para fonte orgânica. Para ele, a logística é um dos maiores gargalos, já que, para os preços se manterem competitivos, o raio de oportunidade do comércio deve ser limitado.
Outra nutrição em destaque são as obtidas a partir de subprodutos, tudo o que pode ser reutilizado e reciclado. Esse tipo de nutrição atende plenamente aos princípios da economia circular e ainda pode gerar economia aos produtores.

Para Alysson, os nutrientes encontrados na palha e casca dos cafés podem render economias significativas aos cafeicultores. E, portanto, além de ser algo disponível aos produtores e importante para o eixo da sustentabilidade, é também benéfico ao solo devido às suas características inerentes e lenta liberação.
‘’Na palha de café é possível encontrar 1,5% de Nitrogênio, 0,15% de Fósforo e 3% de Potássio, enquanto que na casca de café temos 3% de Nitrogênio, 0,15% de Fósforo e 3,9% de Potássio (…). Considerando os preços atuais dos fertilizantes para conversão, temos que uma tonelada de palha custaria em média R$ 523 e da casca de café, R$ 791, representando economias imediatas e relevantes ao produtor.”
João ressalta sobre a disponibilidade de outros subprodutos da cafeicultura como o pergaminho e as águas residuárias, além de estercos gerados por outras atividades comuns na propriedade e seu entorno. Para ele, além de sustentar a rentabilidade, a circularidade dentro da propriedade, pode apoiar outras frentes como a mitigação de eventos climáticos.
‘’O uso de palha e/ou pergaminho em altas doses forma uma camada protetora e portanto além de fornecer nutrientes, também diminui a radiação no solo reduzindo assim a temperatura e perda de umidade na projeção da ‘saia’ do cafeeiro, bem como suprime por algum tempo a competição das plantas daninhas.”
Outro insumo que ajuda na promoção da agricultura sustentável são os bioinsumos, produtos feitos a partir de microrganismos, materiais vegetais, orgânicos ou naturais e utilizados nas lavouras para combater pragas e doenças e/ou para melhorar a fertilidade do solo e a disponibilidade de nutrientes para as plantas.
Para Rangel, temos um potencial incrível de tecnologia nacional. Ele destaca que é possível identificar junto à Embrapa inúmeras soluções ainda não utilizadas no mercado, reforçando que precisamos avançar e incentivar a fixação biológica para outras culturas além da soja.

Dependência X autonomia. Conseguimos suprir nossa demanda com produção nacional?
Como medida de incentivo ao produtor e ao agronegócio, o Governo Federal lançou em março o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF). O plano será referência para o planejamento do setor de fertilizantes até 2050, tendo como um dos objetivos, a redução da dependência de fertilizantes do mercado externo.
Para Rangel, ‘’a autossuficiência não é a meta do plano, já que o mundo vai retornar ao seu equilíbrio. A ideia é sermos soberanos e capazes de suprir até 50% da nossa demanda de fertilizantes até 2050. E essa soberania só poderá ser atingida com o desenvolvimento de produtos diferenciados, domínio de tecnologias, mão-de-obra especializada e capacidade instalada para reagir à crise’’.
Para Tortorella, “produzir lá fora é mais barato”, e, portanto, nosso foco tem que ser em entender o que precisamos fazer internamente para baratear nosso fertilizante. Para ele, o foco está nas iniciativas que fomentem a produção nacional, ou seja, identificar tudo o que precisamos de recursos, inovação, ciência, treinamentos e licenças para impulsionar o setor a produzir mais.
E o segredo é justamente reconhecer que nunca seremos autossuficientes e proporcionar um plano que ajude a trazer de onde for mais competitivo e viabilizar a distribuição do produto ao produtor rural na hora certa e com o preço justo.
Vale destacar que o Plano Nacional de Fertilizantes é composto de vários eixos, sendo a sustentabilidade o mais relevante, de acordo com Rangel. Por isso, para a aprovação de qualquer projeto, haverá requisito mínimo de diretrizes sustentáveis e o cumprimento com a ESG, já que o plano não foca só em sustentabilidade ambiental, mas também social e de governança.
Segundo Rangel, “estamos comprometidos com a governança: não precisamos que o plano seja perfeito, mas precisamos adotar modelos de governança que nos permita corrigir as inadequações e que com isso possamos atingir nossa meta após os 30 anos’’.
João reforça que a otimização na utilização dos fertilizantes minerais e aproveitamento de subprodutos ou fontes orgânicas disponíveis é de fundamental importância para endereçar desafios referentes à rentabilidade do produtor e também às demandas crescentes por produtos com menor pegada de carbono.
‘’O grande desafio é desenvolver maneiras de incentivar a adoção do conhecimento disponível para melhor aproveitamento dos recursos naturais e desenvolvimento contínuo de tecnologias cada vez mais limpas.’’

E como toda crise gera uma oportunidade…
A reflexão que fica com as incertezas dos fertilizantes, é que o solo é o maior patrimônio do produtor e da produtora de café. Dito isso, é importante balancear o que funciona e o que não funciona, fornecendo mecanismos para que o cafeicultor mantenha o equilíbrio do solo e adote o melhor custo-benefício para a sua lavoura de maneira acessível e constante.
Ainda existe espaço para aumento produtivo e redução de impactos ambientais. E, portanto, para que possamos nos manter competitivos e seguir fortalecendo a cada dia a cafeicultura e o agro brasileiros, são necessários desenvolvimentos simultâneos na produção, distribuição e comercialização.
É necessário fomentar a assistência técnica, incentivar o crédito rural, oferecer segurança jurídica para atração de investimentos e criar condições de reanálise cíclica. Dessa forma, a produção do café brasileiro ganhará maior autonomia e deixará os cafeicultores e cafeicultores mais tranquilos para realizarem seu trabalho em busca de mais e mais qualidade.
Créditos: Divulgação Anda; banco de imagens.
PDG Brasil
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