Para muitos, uma xícara de café é uma parte central da experiência de viagens aéreas. Na sala de espera e a bordo da aeronave, é uma necessidade para alguns, graças a atrasos prolongados, partidas antecipadas ou voos longos. No entanto, é inegável que a conveniência tem sido historicamente uma prioridade para o café da companhia aérea, com qualidade e sabor geralmente ocupando um segundo plano.

Nos últimos anos, um número crescente de companhias aéreas começou a investir no café que serve aos seus clientes, tanto em sustentabilidade quanto de qualidade. Um bom café tornou-se uma vantagem competitiva para as companhias aéreas, bem como uma oportunidade de representar as marcas locais.

Para saber mais sobre essa tendência, conversamos com Ben Styche da Union Hand-Roasted Coffee, Solomon Tadele, da OneKoo Coffee, e Marilyn Kiriakos da Hawaiian Paradise Coffee. Continue a ler para descobrir o que eles disseram.

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Por que o café servido pelas companhias aéreas historicamente não tem sido de alta qualidade?

Quando se trata de café em aviões comerciais, a função tem sido historicamente mais uma prioridade do que o gosto.

Ben Styche é o Diretor Comercial da Union Hand-Roasted Coffee. “Ele sempre ficou em segundo plano para bebidas alcoólicas e alimentos”, diz ele. “Infelizmente, café e chá são vistos de forma mais funcional, como algo quente e cafeinado.”

Embora o café barato e de baixa qualidade possa ser parcialmente culpado por isso, também há outros fatores em jogo.

A altitude

A altitude altera nossa percepção de gosto. Enquanto um bebedor de café que está apenas à procura de uma bebida quente e um pouco de cafeína pode não se importar com isso, os consumidores que estão à procura de uma xícara mais matizada e complexa vão achá-lo frustrante. 

Em primeiro lugar, o ar da cabine diminui nossa capacidade de cheirar. É claro que isso está diretamente ligado ao sabor. Em um plano, a sensibilidade ao paladar pode ser reduzida em até 30%. 

“A 37.000 pés de altitude, também é mais difícil identificar a acidez”, acrescenta Ben. “Além disso, a percepção de doçura entra em colapso e o amargor é acentuado.”

A altitude causa muitas mudanças que afetam a experiência sensorial, incluindo inchaço, aumento do estresse, desidratação e níveis de energia mais baixos. Temperaturas mais baixas a bordo também significam que o café quente tenderá a esfriar mais rapidamente do que no chão.

A água

A água desempenha um papel enorme para o café de alta qualidade. O café e o chá servidos em aeronaves são preparados com água da torneira não filtrada, portanto, é improvável uma qualidade excepcional. 

No entanto, existem outras diferenças. Ao contrário da água que bebemos em casa, a água da aeronave é transportada do aeroporto e alimentada diretamente no tanque de água da aeronave. Portanto, é provável que a qualidade da água (em termos de café) possa ser inferior à média da água da torneira, dependendo do estado dos canos e do tanque da aeronave. 

O preparo

Ben explica que o equipamento de preparo de café com o qual você tem que trabalhar a bordo é um desafio. Devido ao pequeno espaço de cabine disponível e às considerações de segurança, as opções permanecem limitadas. 

O preparo de café deve contar com uma combinação simples de café e água quente – equipamentos de alta qualidade são muito impraticáveis para aviões.

O serviço

O serviço é um importante valor acrescentado para a experiência do consumidor. No entanto, o café da companhia aérea é servido por comissários de bordo, não por baristas. O café, portanto, provavelmente não terá a mesma atenção aos detalhes ou atendimento personalizado ao cliente como seria em um café especializado.

Por que as companhias aéreas estão agora investindo em cafés melhores?

Conheça abaixo algumas razões pelas quais nossos entrevistados avaliam serem as responsáveis pelos investimentos recentes de companhias aéreas no serviço de café nos aviões. 

Vantagem competitiva

Marilyn Kiriakos-Askari é a vice-presidente da Hawaiian Paradise Coffee. Segundo ela, as companhias aéreas estão optando por investir em melhor café para dar-lhes alavancagem sobre outras companhias aéreas com preços competitivos. 

“Quando uma empresa tem padrões de marca mais altos, ela atrai um consumidor de maior qualidade, mais disposto a gastar em outros itens”, explica. “Isso ajuda as companhias aéreas a ganhar mais dinheiro de outras maneiras.”

Marilyn considera inteligente que as companhias aéreas considerem as pessoas que viajam a trabalho. Eles podem optar por escolher uma companhia aérea com um custo de passagem mais alto que ofereça mais benefícios, acomodações e serviços gratuitos porque é uma despesa comercial coberta.  

“Melhores serviços de café em voos matinais seriam uma característica atraente para esses clientes e proporcionariam um bom retorno sobre o investimento”, diz ela.

Demanda dos consumidores por qualidade e sustentabilidade

A terceira onda de café, mídia social e um crescente mercado de café especial contribuíram para que os consumidores médios de café estivessem mais expostos a um café de melhor qualidade. Naturalmente, a demanda do consumidor por café de qualidade, por sua vez, aumentou. 

Os consumidores e as marcas estão também cada vez mais conscientes dos efeitos devastadores das alterações climáticas e das questões éticas nas cadeias de abastecimento mundiais. 

As marcas estão sendo responsabilizadas, portanto, investir em opções mais sustentáveis tornou-se uma boa maneira de alcançar novos clientes – especialmente aqueles que pertencem à demografia mais jovem.

Ben diz que está animado para ver essa mudança acontecendo, pois qualidade e sustentabilidade estão no cerne da marca Union.

“Mais e mais pessoas estão agora expostas a café especial de alta qualidade todos os dias”, diz ele. “Com isso, os consumidores também estão exigindo melhor rastreabilidade, transparência e sustentabilidade. O café de maior qualidade e de origem ética está se tornando a norma.”

Ele ressalta, no entanto, que negócios de café de melhor qualidade com companhias aéreas são muitas vezes exclusivos para classe premium e executiva. 

Melhoria do café a bordo: uma colaboração

Nos últimos anos, começaram a surgir novas parcerias entre companhias aéreas e marcas de café artesanal. Em muitos casos, essa é uma maneira de oferecer um produto melhorado e colocar mais foco na experiência do cliente em lounges de aeroportos e em voos. 

Para a Union, a parceria com a British Airways começou no London Coffee Festival em 2016. Ben diz que depois de conversar com um representante, eles tiveram a ideia de aumentar a qualidade do café da companhia aérea juntos. 

“Tínhamos um representante viajando de Londres para Nova York para provar o café no voo”, explica. “Queríamos ter certeza de que poderíamos oferecer uma boa combinação que permanecesse doce e limpa durante o voo.”

Encontrar o ajuste certo para o café em um avião não é fácil. O tamanho da moagem, o perfil de torrefação e o método de preparo precisam trabalhar juntos para produzir o melhor resultado em um ambiente desafiador. 

Ben me diz que sua equipe também treinou a tripulação de cabine da British Airways em técnicas de preparo de café para garantir bons resultados. 

“O resultado foi tão gratificante quando finalmente acertamos”, explica Ben. “A equipe da British Airways nos disse que o gosto era mais leve e brilhante do que qualquer coisa que eles já tiveram antes no avião.”

A Hawaiian Paradise Coffee assinou um contrato de cinco anos com a Hawaiian Airlines. Marilyn conta que eles começaram a explorar uma parceria três anos antes.

“Dá muito trabalho. Trabalhamos juntos na criação da oferta de café certa para o voo deles”, explica. “Exploramos diferentes opções de preparo de café durante o voo até encontrarmos o ajuste certo. Somos uma marca que cria perfis personalizados, que era o que eles estavam procurando.”

Promoção de marcas locais

Em alguns casos, essas parcerias podem representar um impulso para apoiar as marcas locais, dando aos clientes um gostinho do país por trás da companhia aérea.

Solomon Tadele é gerente de café da marca de café torrado da Oromia Coffee Farmers Cooperative Union, OneKoo. 

Ele me diz que eles assinaram um memorando de entendimento para trabalhar com a Ethiopian Airlines como fornecedores de café verde e torrado. O objetivo da parceria, diz ele, é promover um café etíope de boa qualidade em voos etíopes. Como local de nascimento do café, ele explica que faz sentido comercializar sua experiência. 

Marilyn concorda e explica que os passageiros às vezes esperam uma mistura de café havaiano como parte da experiência havaiana. 

“Ser o único estado dos Estados Unidos que cultiva café nos torna únicos”, diz ela. “O Havaí também é uma ilha no meio do Oceano Pacífico com uma diferença de tempo significativa para a maioria dos viajantes, então o café ajuda a energizar as pessoas enquanto voam e pode até ajudá-las a se adaptar à mudança de fuso horário.”

Quanto à Union, Ben explica que uma unidade de torrefação perto do lounge da British Airways pode até passar a fazer parte do ponto de venda da parceria.

“Para a British Airways poder dizer que esse café é torrado a 40 quilômetros do lounge onde os passageiros estão é um grande bônus”, explica ele.

Ter um café melhor em voos se tornará comum?

Assim, com o preço C volátil, a inflação em alta e outras questões da cadeia de suprimentos, o investimento em café melhor e mais caro em aeronaves é apenas uma tendência passageira?

Marilyn concorda que o futuro é incerto. No entanto, ela acredita que a maioria dos consumidores de café vê o café como uma necessidade e, para muitos, um bom café é um pequeno luxo que eles não podem dispensar.

“É difícil dizer como os preços agora afetarão as vendas no futuro. Um bom café em voos pode ser uma tendência passageira ou não”, diz ela. “Mas olhando para a sua evolução através de diferentes períodos e culturas, eu sinto que bons cafés estão aqui para ficar.”

Ben concorda e diz que os consumidores vão reclamar se a qualidade começar a diminuir. 

“Aqueles que continuam investindo em qualidade vencerão no final. Um café de melhor qualidade e de origem sustentável é mais normal agora do que nunca”, diz ele.

De acordo com Ben, a próxima inovação nos próximos anos será um melhor equipamento de preparo de café e uma gama mais ampla de opções de leite em aeronaves.

Salomão está esperançoso. Ele vê uma demanda por cafés finos, rastreáveis e de origem única que, na opinião dele, não mostra nenhum sinal de desaceleração. Ele, no entanto, admite que, na Etiópia, as companhias aéreas podem hesitar em investir em opções de café mais caras devido a uma lacuna de conhecimento. 

“Somos um dos fornecedores de café arábica etíope de melhor qualidade por aí, com mais de oito certificados internacionais de sustentabilidade em café verde”, explica. “No entanto, muitos etíopes muitas vezes não reconhecem essa diferenciação de qualidade, ou seu valor. Acredito que isso mudará em breve.”

Companhias aéreas em todo o mundo estão explorando ativamente novas parcerias para um café melhor. E, enquanto o café em voo pode nunca ter um sabor tão incrível quanto no chão, servir café de qualidade de torrefadores que sabem o que estão fazendo é um passo na direção certa.

Para as marcas de café, essa tendência pode ser uma grande oportunidade de ganhar mais exposição ao atingir um imenso público internacional. No entanto, resta saber se esse é ou não um desenvolvimento que está aqui para ficar.

Créditos: Union Hand-Roasted, OneKoo, Paraíso Havaiano.

Tradução: Daniela Andrade. 

PDG Brasil

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