O ABC do moinho de café em casa
Os cafés especiais são mais caros e deliciosos por serem produzidos de forma a respeitar o tempo de maturação dos frutos, coletados seletivamente, e processados em ambientes controlados para amplificar a qualidade e os sabores. Porém, para poder obter as vantagens sensoriais derivadas dos grãos, é preciso também extrair a bebida resultante da maneira ideal.
A espessura da moagem deve estar devidamente regulada para cada método de extração, e idealmente, os grãos devem ser triturados na hora do preparo para se aproveitar o maior potencial da bebida.
O PDG Brasil conversou com os especialistas em moinho de café Leonardo Pasquali e Lucas Salomão, para criar um guia de boas práticas dos níveis de moagem ideais para extrações caseiras, com dicas de maquinários e níveis de granulometria.

A importância da moagem
“Quando o café é moído, o processo de oxidação é multiplicado, já que a superfície do grão fica mais exposta, o que amplifica o processo de decomposição natural”, explica Leonardo, gestor e especialista da Pasquali Máquinas, empresa que comercializa equipamentos importados e presta assistência técnica.
A extração é a ação de retirar componentes solúveis em água derivados do grão do café.
“Em média, no máximo 30% de um grão de café é solúvel em água. A solubilidade ou quantidade de extração incluem entre outras variáveis a espessura do pó de café (granulometria)”, explica Leonardo.
Independentemente do método escolhido de extração do café, não é possível preparar café com grãos inteiros: “É necessário dividir cada grão torrado em milhares de partículas para que a superfície do grão torrado esteja mais exposta. É esse o processo que chamamos de moagem”, diz Leonardo.
Os métodos de preparo de café mais conhecidos são: turco, espresso, moka, Kalita Wave, Hario V60, batch brew, Aeropress, prensa francesa e cold brew, entre outros. Uma gama de moagem será recomendada como referência para cada método, e há receitas-base com proporção de água para gramas de café, usadas costumeiramente, para o preparo ideal da bebida em cada método de extração.

Moagem e granulometria ideal para cada método de extração
Cada método de preparo inclui uma ou mais variáveis importantes à extração de café e que, combinadas com diferentes granulometrias (padrões de moagem), produzem resultados característicos. As variáveis de extração incluem entre outras os seguintes fenômenos e condições: temperatura, agitação (também conhecida como turbulência), pressão, tempo de contato/fluxo e solubilidade.
“Em todas essas condições, prevalece a regra teórica de que, em cada variável, quanto maior o seu número, maior será a extração. Exemplo: se a temperatura é mais alta, maior o volume de extração; quanto mais longo é o tempo de contato, mais intensa será a bebida resultante da extração”, explica Leonardo.
Abaixo, a lista criada por Leonardo quanto à espessura ideal de moagem para diversos métodos:
- Turco – extremamente fino
- Espresso – muito fino
- Moka – fino
- Aeropress – média fina
- Coado (Kalita, Hario, Origami, Koar e outros métodos cônicos) – média
- Máquina de Café Coado (Batch Brew) – média grossa
- Chemex – média grossa
- Prensa Francesa – grossa
- Cold Brew – muito grossa
Vale lembrar que essas sugestões são resultado da experiência prática com os diferentes métodos, mas não deixam de ser pontos de partida. Especialmente nos métodos cônicos, o leque de possibilidades é grande, sendo que, para cada café, e em diferentes condições (como as variáveis que citamos acima), é possível testar diferentes moagens para conhecer os melhores resultados na xícara.

Boas práticas de moagem para métodos caseiros
Pour-over (ou, como chamamos aqui no Brasil, coado ou filtrado)
Moagem em partículas excessivamente finas para métodos cônicos com filtro de papel, como Melitta, Kalita Wave, Koar, Origami ou Hario V60 gera o efeito inverso do que ocorre com o espresso. É importante sempre lembrar que é preciso umedecer os filtros com água quente antes da extração, para facilitar tanto a penetração da água em contato com o café quanto promover a limpeza do excesso de goma do papel.
A resistência dos poros dos coadores de papel unida à necessidade de derramar a água de forma a promover a percolação devida, demanda que o nível de moagem seja de fino a médio, para evitar uma aglutinação excessiva das partículas de café, o que dificulta a passagem da água. “O que entrega que a moagem está fina demais é o tempo excessivo de extração e uma bebida de alto amargor e pouco corpo”, explica Leonardo.

Prensa francesa
Leonardo diz que o processo de moagem para a prensa francesa pede partículas de café grossas e uniformes, e o mais importante é separar as partículas finas das grossas.
Isso porque o processo de extração da prensa francesa demanda muitos minutos de imersão entre os grãos e água, em média, de 4 a 8 minutos. Por conta disso, a granulometria deve ser maior, pois grãos finos não são retidos pelo sistema de filtragem da prensa. Grãos finos “roubam” gramas de café que deveriam se incorporar à água, e a extração fica incompleta, resultando em uma bebida diluída, amarga e sem corpo.
O teste para saber se a moagem está ideal é conferir se a xícara fica com uma “lama” de café quando acaba a bebida, o que significa que as partículas finas ficaram misturadas com as grossas.

Espresso
A moagem muito grossa para o método espresso é o maior impedimento a uma boa extração da bebida em casa. O que acontece, segundo explica Leonardo, é que, quando o nível de moagem não está correto e devidamente compactado, haverá baixa resistência quando a água entra em contato com o café.
“O resultado tende a ser um café de baixo perfil aromático, muitas vezes sem corpo e com acidez elevada e sem balanço.”

Moka Pot / Cafeteira italiana / Moka
A extração de café pela cafeteira moka demanda uma moagem nem tão grossa, nem tão fina. Muita gente acredita que a moagem fina como a do espresso é a ideal para a Moka, mas isso gera um bebida sub extraída e com muitos resíduos.
O processo de extração ideal na moka acontece quando há espaço para as partículas de vapor da água se expandirem quando entram em contato com o compartimento dos grãos, o que não acontece se a moagem estiver muito fina e formando um bloco que impede a incorporação da água. Já partículas grossas de café não se misturam à água corretamente. Nesse caso, aumentar o tempo de extração para esperar a extração faz com que se queime a cafeteira e a bebida.

Modelos de moinhos caseiros: as sugestões dos especialistas
Antes de escolher um moedor, é importante entender quais as reais demandas de uso do aparelho, diz Lucas, que é campeão brasileiro da Brewers Cup e bi-campeão da Copa Barista em 2016.
“Seja comprando um mais caro quando um mais barato serviria, ou de modo reverso, quando o barato acaba saindo caro.” Tudo depende das circunstâncias da escolha: se o barista caseiro quer uma moagem rápida, se gosta da experiência de levar o moedor em viagens etc.
Os moedores mais básicos são compostos de lâminas e apresentam pouca variação de controle de granulometria, mas tudo depende do perfil do dono do moinho. Os modelos funcionam como um liquidificador, explica Lucas: alguns têm apenas o botão de pulse, e alguns modelos apresentam uma pequena variação de regulagem. “Os modelos com regulagem conferem uma uniformidade melhor que os de pulso”, diz ele.

Lucas, em casa, tem os dois tipos de moedores, o manual e o automático.
“Eu tenho um Hario Slim, que é manual e leve, justamente para levar comigo, tomar um bom café na casa de um amigo ou levar em uma viagem. É gostoso moer ‘na mão’ também, é relaxante”, diz Lucas. Ele acha importante quebrar o mito de que um moedor bom não exige força manual na moagem. “É um bom custo benefício, e com o Slim já obtive qualidades melhores de bebida quando em comparação a um moedor elétrico”, salienta Lucas. Tudo depende do café do gosto de quem o prepara. Lucas sugere a linha de moinhos manuais da marca brasileira Bravo.
Leonardo recomenda para iniciantes o moedor elétrico Baratza Encore, com gama de moagem simples: “O moedor vem com lâminas cônicas e 40 ajustes de granulometria, versátil para moer desde espresso até prensa francesa (muito fino ao muito grosso)”.
O moedor elétrico de Lucas é o Baratza Forte+, o qual acredita ser o melhor modelo de moedor para usar em casa: “É robusto, preciso, e já até o usei em algumas competições. É um moedor versátil e contém uma balança de precisão integrada”. O modelo Forte+, também uma opção apontada por Leonardo, dispõe de mais nuances de customização e controle de granulometria, e três opções de base além das reguláveis.
As recomendações finais de Lucas são sempre testar o moinho novo com um café ao qual já se está habituado, e aprender, por meio de testes, a regular a moagem para o tipo de método desejado. “Não adianta ter um moedor bom se a moagem não está adequada”, diz ele.

À parte da preferência da bebida resultante de cada método, a regra quanto aos maquinários relacionados à extração de café é simples: a escolha deve ser realista. Há moinhos para todos os gostos e bolsos, que demandam mais ou menos tempo de manuseio, mas todos cumprem o papel de conferir ao barista caseiro a experiência de moer um café fresquinho para qualquer tipo de método.
Créditos: Wade Austin Ellis (café moído sobre balança); Devin Avery (Kalita); Helena Lopes (prensa francesa); Pixabay (espresso e moka); Divulgação Orfeu Cafés (moinho Hario Slim); Divulgação Baratza.
PDG Brasil
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