Para a população urbana da China, os serviços de pagamento digital estão em toda parte. Muitas pessoas usam aplicativos móveis para encomendar e pagar por produtos, incluindo café, quase todos os dias.

O WeChat e o Alipay são os dois serviços de pagamento mais populares do país. Ambos também têm seus próprios serviços de entrega de alimentos e bebidas: Meituan (美 团, em chinês) e Ele.me (饿了么, em chinês).

A Covid-19 naturalmente acelerou o crescimento do mercado global de entrega de alimentos e bebidas. No entanto, esses serviços de entrega, conhecidos como waimai (外 卖, em chinês), já eram uma parte indispensável da vida cotidiana de muitos consumidores chineses.

Felipe Cabrera é CEO e fundador da Ad Astra Coffee Consulting em Xangai. Ele trabalha na indústria de café chinesa desde 2015. Neste artigo, ele explora porque os serviços de entrega de café na China são populares e como eles estão influenciando o mercado de café mais amplo do país.

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Quando surgiu o mercado de entrega de café na China?

Muitos cafés independentes nas maiores cidades da China têm prestado serviços de entrega há algum tempo. No entanto, esses serviços se tornaram muito mais difundidos quando a cadeia chinesa Luckin Coffee lançou seu serviço de entrega em 2017.

Apesar de abrir suas primeiras lojas em 2017, a Luckin opera atualmente em mais locais na China do que a Starbucks. Em comparação, a Starbucks foi lançada pela primeira vez na China em 1999.

Como muitas grandes marcas de café, a oferta de serviços de entrega desempenha um papel importante no sucesso da Luckin. Não há caixas nas cafeterias Luckin. Em vez disso, os clientes fazem os seus pedidos através do aplicativo móvel da rede, após optarem por retirar ou receber em casa.

Outras marcas de café chinês imitaram o modelo de negócios focado em entregas da Luckin, mas com menos sucesso. Um exemplo é a Coffee Box, que teve várias lojas populares em Xangai entre 2018 e 2019. No entanto, a Coffee Box fechou a maioria de suas lojas em 2020, provavelmente devido à pandemia.

No entanto, cadeias de café maiores no país lançaram serviços de entrega com níveis de sucesso notavelmente semelhantes aos da Luckin. A Starbucks China iniciou suas entregas no final de 2018 através de uma parceria com a Ele.me. Desde então, a McCOAc e a Tims China lançaram seus próprios serviços de entrega.

Mas, embora cadeias maiores tenham ajudado a estabelecer o mercado chinês de entrega de café, são principalmente cafés independentes que oferecem esses serviços.

De acordo com dados da Deloitte, existem cerca de 108.500 cafés na China. Em dezembro de 2021, a Luckin operava em torno de 5.671 lojas, enquanto a Starbucks China tinha cerca de 5.400 locais.

Isso significa que cafés independentes menores representam cerca de 87% do mercado de cafés do país, enquanto cadeias maiores como Luckin e Starbucks coletivamente têm cerca de 10% de participação de mercado.

À medida que o consumo de café da China cresce a uma taxa impressionante, as evidências sugerem que tanto as cadeias comerciais quanto as cafeterias especializadas estão influenciando como as pessoas consomem café no país.

Por que esses serviços são tão populares?

Embora as entregas de café sejam usadas principalmente nas cidades classificadas em “primeiro grau” no ranking de desenvolvimento da China (como Pequim, Xangai, Guangzhou e Shenzhen), esses serviços estão se tornando cada vez mais populares nas cidades classificadas em segundo e terceiro grau nesse ranking.

Uma das principais razões para o crescimento do mercado de entrega de café é a conveniência. Em vez de visitar cafés, os clientes podem fazer pedidos por meio de aplicativos de entrega. No caso da Luckin, a entrega é garantida dentro de 30 minutos.

Os clientes também podem selecionar suas preferências de bebidas nesses aplicativos, como escolher a torra ou adicionar adoçante.

Cafés menores, por sua vez, usam o ecossistema de mídia social chinês para promover seus produtos e oferecer descontos exclusivos aos clientes de entregas. 

Plataformas como WeChat, Red (小 红书, em chinês) e TikTok chinês (chamado Douyin ou 抖 音, em chinês) anunciam em aplicativos de entrega como Meituan, Ele.me e Dazhongdianpin (大 众点 评, em chinês). Só o WeChat tem mais de um bilhão de usuários ativos por mês, o que significa que essas cafeterias são capazes de alcançar uma quantidade impressionante de clientes em potencial.

No entanto, não são apenas os consumidores que se beneficiam do uso de aplicativos de entrega de café.

Ao analisar os dados coletados de aplicativos de entrega, os proprietários de cafeterias podem acompanhar o número de entregas de café por dia. Eles também podem ver quais bebidas são as mais populares, o que pode ajudar a promover ainda mais esses produtos.

Além disso, os proprietários de cafeterias também podem usar dados de vendas para ajustar os níveis de estoque e potencialmente reduzir o desperdício de café e leite. 

O feedback dos clientes também é útil para os proprietários de empresas. Os aplicativos de serviço de entrega permitem que os usuários deixem avaliações e comentários de seus pedidos e da experiência geral.

Os millennials e a entrega de café

A maioria dos usuários de serviços de entrega de café na China tem entre 22 e 39 anos, o que significa que a maioria deles é de millennials. A geração Z (a geração pós-millennials) geralmente preferem visitar cafés para socializar com os amigos.

Em cada uma das cidades de primeiro nível da China, os millennials têm seus próprios hábitos exclusivos de compra de café. No entanto, há tendências gerais nos mercados de entrega de café do país.

Geralmente nessas cidades, os jovens profissionais pedem cafés por meio desses aplicativos em média dois dias por semana, se não todos os dias. Graças ao fato de que eles têm uma renda média mais alta do que as gerações anteriores, os millennials chineses estão ajudando a impulsionar o crescimento do mercado de entrega de café.

Os clientes fazem a maioria dos pedidos de café entre o meio-dia e o final da tarde. As entregas são muitas vezes para escritórios, pois os jovens profissionais acham mais conveniente do que visitar cafés.

Pedidos em grupo para escritórios também são comuns, já que os clientes também farão pedidos para seus colegas. Normalmente, pedidos maiores resultam em descontos maiores, já que muitas marcas de café menores precisam permanecer competitivas. Assim, cafés que oferecem mais promoções geralmente atraem mais clientes, incentivados a fazer pedidos maiores.

Na maioria das cidades de primeiro grau, as bebidas à base de leite, como os lattes, continuam sendo as opções mais populares. Em outras cidades, padrões semelhantes de consumo de café também estão se tornando mais proeminentes.

Influência no mercado mais amplo do café chinês

Desde o início da pandemia, várias cafeterias pequenas na China dependem muito dos serviços de entrega para se manterem no negócio. A atual política de zero-Covid do país está forçando cerca de metade da população de Xangai a permanecer em casa a qualquer momento. Isso está, sem dúvida, reduzindo o tráfego de pedestres em muitos dos cafés independentes da cidade.

Durante o primeiro trimestre de 2020, muitas cafeterias em cidades de primeiro nível, como Xangai, fecharam devido à Covid-19. No entanto, no segundo trimestre do ano, a maioria dessas lojas foram reabertas sob nova gestão. 

Quando reabriram, muitos desses novos cafés se concentraram em entregas e retiradas para aumentar as vendas. E, à medida que a pandemia continua, a maioria das cafeterias não tem escolha a não ser fortalecer sua presença on-line e ampliar sua promoção de produtos e serviços de entrega.

O aumento dos preços de aluguel comercial em cidades como Xangai também empurrou mais cafés para favorecer os serviços de entrega em vez de hospedar clientes na loja. Normalmente, um café independente em Xangai não mede mais do que 25 metros quadrados (ou mesmo menor), com apenas algumas mesas disponíveis para os clientes. Os serviços de entrega e retirada ajudam essas lojas menores a aumentar a receita.

Para os consumidores de café chineses, o crescimento do mercado de entrega pode potencialmente influenciar as tendências de consumo a longo prazo. Os clientes podem muito bem esperar receber seus cafés dentro de um curto período de tempo e querer que seus cafés sejam entregues na temperatura certa (quente ou fria), aumentando a demanda por prazos de entrega mais rápidos.

Os serviços de entrega chineses terão influência sobre outros mercados de café?

É evidente que os serviços de distribuição de café já tiveram um enorme impacto na cultura de café da China, em constante crescimento, particularmente no que diz respeito à procura de conveniência. Mas há potencial para outros mercados internacionais de café também dimensionarem sua infraestrutura de entrega de café da mesma maneira?

Em 2020, os aplicativos de mercearia e entrega de refeições estavam entre as categorias de crescimento mais rápido do mundo. Os downloads e os usuários de aplicativos de entrega de refeições cresceram mais de 32% naquele ano, à medida que mais clientes usavam os serviços de entrega durante o auge da pandemia.

Nos EUA, as principais empresas de entrega de alimentos e bebidas (como Uber Eats e DoorDash) tiveram uma receita combinada de US$ 5,5 bilhões entre abril e setembro de 2020. Isso representa mais do dobro da receita total combinada que fizeram em 2019.

As vendas globais de café nas plataformas de entrega também dispararam durante a pandemia. O Uber Eats informou que o número de pedidos de café na plataforma aumentou 149% entre março e junho de 2020. E, como na China, o Uber Eats disse que, em todo o mundo, o café com leite foi a bebida mais encomendada na plataforma no mesmo período.

Em todo o mundo, o crescimento dos aplicativos de entrega de alimentos e bebidas não mostra sinais de desaceleração. Mesmo que algumas partes do mundo afrouxem suas restrições à Covid-19, parece que pedir café para entrega se tornou uma espécie de norma para muitos consumidores.

Embora os serviços de entrega de café sejam comuns em muitos países, o crescimento absoluto e incomparável do mercado de entrega da China é um exemplo sólido de como as cafeterias podem utilizar esses sistemas a seu favor.

Ao oferecer descontos e usar plataformas de mídia social para promover produtos, as cafeterias chinesas estão aumentando suas vendas em todos os setores.

Mas outros mercados internacionais seguirão o exemplo a longo prazo? Pedir café de nossos telefones se tornará a norma em todo o mundo? Não há respostas para essas perguntas no momento, mas certamente será interessante ver como outros países consumidores de café se adaptam.

Créditos: Felipe Cabrera.

Tradução: Daniela Andrade.    

PDG Brasil

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