31 de maio de 2022

Classificação dos Cafés no Brasil explicada: tipos e defeitos

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Depois de um ano de dedicação, manejo, colheita e pós-colheita, chega a hora do veredito final: a avaliação da qualidade do café que produzimos – e , consequentemente, quanto ele vai valer. É a chamada classificação do café, feita por classificadores profissionais.   

A classificação do café físico por tipo, no Brasil, é conduzida tendo como guia a catalogação da soma de impurezas e defeitos encontrados em grãos de café verde, baseada na Tabela Oficial para Classificação da COB (Classificação Oficial Brasileira), do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). 

Trata-se de um conjunto de processos e regras pré-estabelecidas pelo MAPA quanto às análises de classificação da qualidade do café produzido em território nacional, para fins de comercialização no Brasil e no mundo. 

Neste artigo, o PDG Brasil vai explorar as metodologias específicas das classificações de café por tipo e contagem de defeitos, e sobre como o mercado de comercialização de café lida, na prática, com a tipificação definida na COB para conduzir as negociações.

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café em coco

A análise física da qualidade do café no Brasil

Os critérios utilizados pela COB para a classificação dos cafés beneficiados em relação à descrição comercial são baseados fundamentalmente no tipo e na bebida. Para a normativa, o tipo é o indicador principal da qualidade do café, segundo apontam Fabio Lyrio Santos e José Flávio Diniz Nantes, autores da pesquisa “Coordenação no mercado do café brasileiro: o desserviço da classificação por defeitos”. 

As primeiras classificações de café no Brasil datam de 1836, com reportes discriminando cor, aspecto e tamanho dos grãos verdes de café. Em 1885, a Bolsa de Café de Nova York passou a adotar a classificação de acordo com a contagem de defeitos das amostras, usada como base do sistema brasileiro que se desenvolve desde então.  

O café verde é classificado, então, por meio de processos de análises organolépticas e físicas.

A análise física avalia o grão-cru e verde, por meio de amostras que podem ser classificadas diretamente pelo produtor, corretores de café, cooperativas, intermediários ou compradores. 

A análise organoléptica identifica a qualidade da bebida por meio da avaliação das propriedades sensoriais ao ser degustada depois da torra e da preparação (prova da xícara). Nessa análise, a bebida é classificada por sabor, aroma e corpo (cujo processo o PDG Brasil vai abordar em outro artigo). Essa etapa é conduzida após a análise física do café.

café terreiro classificação

Análises físicas

Estas são as variedades de processos de qualificação por meio de análises físicas:

  • classificação por tipo, o que se dá pela contagem de defeitos; 
  • classificação via granulometria, na qual os grãos são medidos por meio de um jogo de peneiras, cuja numeração é organizada por forma e tamanho; 
  • classificação de cor (ou classe), o que discrimina a idade, condições de armazenamento e possíveis doenças do cafeeiro absorvidas pelos grãos; 
  • classificação quanto à umidade, que avalia o índice de água presente nos grãos e as correlações com qualidade. 

Cada comprador, nacional ou internacional, pode requerer certas descrições e avaliações extras, de acordo com a demanda.

beneficiamento café

A separação de impurezas: o beneficiamento

Após a colheita, o processamento/preparo dos frutos e o armazenamento, os grãos passam pela fase do beneficiamento, que é a primeira fase da preparação dos lotes para a classificação de qualidade. 

Os frutos do café colhidos e já processados (por via úmida ou seca) são submetidos à ação de máquinas de limpeza e descascadoras, como os catadores-de-pedra, as bicas-de-pedra (pré-limpeza e transporte), catadores-de-torrões, de peneiras (não as mesmas do jogo usado para a classificação), ventiladores e outras, para alcançar o resultado final de limpeza e descascamento de forma satisfatória aos padrões do mercado. 

Após essa etapa, o café é denominado de “bica-corrida”, que é todo grão já beneficiado, mas ainda não classificado. O café bica-corrida também tem um preço de mercado, e corresponde a grãos não-selecionados, ou seja, de tamanhos e formas diferentes, lotes diferentes, e pode ser negociado antes até do beneficiamento. 

classificação café

A classificação do café por tipo 

A classificação por tipo, segundo a COB, estabelece como padrão a contagem dos defeitos do café, e avalia apenas grãos verdes (não torrados) e já beneficiados (bica-corrida). 

São sete os tipos de café classificados, agrupados em sete valores decrescentes, de 2 a 8, sendo o tipo 2 o equivalente ao maior nível de qualidade. 

A amostra usada para classificar os lotes de café cru, e beneficiados, devem conter 300 gramas, cujos grãos são avaliados de acordo com a incidência de defeitos. 

Os defeitos são categorizados e tipificados segundo a quantidade mensurada em duas classes: internos (intrínsecos) ou externos (extrínsecos). Cada defeito corresponde a um valor equivalente na tabela de classificação oficial usada para o processo. 

peneiras café

Classe de defeitos: externo e interno

Os defeitos inerentes do grão do café são conhecidos como intrínsecos (internos). Defeitos que contemplam grãos malformados, grãos brocados (acometidos por fungos), grãos atacados por insetos, ou pretos, verdes e ardidos, também chamados de PVA. Grãos pretos são categorizados como o defeito mais grave, de maior peso.

os extrínsecos (externos) são as impurezas e detritos não derivados do grão, como cascas e pergaminhos, pedras, paus e pedaços de outros vegetais oriundos ou não do fruto do café.

O cálculo dos níveis de qualidade 

A “conta” é feita com a somatória dos defeitos, entre grãos inviáveis, “sujeiras” e impurezas, todos discriminados na cédula com modelo oficial da COB. O resultado em número é associado ao tipo correspondente descrito na tabela oficial de análise física de feitos.

tabela café defeitos

Se a amostra de café de grão cru já beneficiada ultrapassar 1% quanto a impurezas e defeitos descritos, segundo as normas da COB, o lote deve passar por outro beneficiamento, cujo processo se chama re-beneficiamento (processo de nova catação para eliminar defeitos físicos, além de outra peneiração).

Conheça a tabela dos tipos e defeitos do café: 

tabela café tipos

O café com até 4 defeitos é o considerado de maior qualidade, com equivalência a 100 pontos. Já o café com 360 defeitos é o pior da lista de classificação, e o mínimo para venda gira no valor base de 5 pontos, ou 26 defeitos. Os cafés especiais, são comercializados por via direta, ou seja, à parte do mercado de bolsas de valores de commodities, classificados em média de 80 pontos para cima, ou do tipo 2 para cima.

peneiras classificação café

A realidade na prática da classificação física de café no Brasil

O mercado segue as orientações da COB como base, mas não como regra. “A classificação por tipo ‘ao pé-da-letra’ caiu em desuso”, diz André Peres, corretor de café da ACS Exportações, baseada em Santos.

“A maioria das operações inclui o envio de amostras a clientes, o que elimina a necessidade de pré-discriminar todas as variações de análises por parte dos corretores”, explica. Na época da publicação da COB, em 2013, era prática que os classificadores de café fossem submetidos a cursos e provas para poderem aferir certificados. “Atualmente, a maioria dos classificadores são treinados dentro dos escritórios”, conta André. 

“As análises físicas são feitas de acordo com as demandas da transação comercial”, explica André, e caso haja qualquer tipo de disputa entre as partes, são incluídas cláusulas de arbitragem quanto à validação da qualidade descrita nos contratos. Nos EUA, por exemplo, é a National Coffee Association que conduz tais mediações.

terreiro café

O mercado brasileiro e os tipos de café mais comercializados

O mercado aceita a medida de que o café beneficiado exportado tenha, em média, 120 defeitos por 300 gramas (cafés que no Brasil são considerados premium, gourmet, especiais). Após o re-beneficiamento, a média deve ser 45. 

O índice de defeitos pós-beneficiamento dos grãos destinados ao mercado brasileiro é muito maior. A média de maior qualidade das transações usuais do mercado nacional é de 360 defeitos, tipo 8. 

Cerca de 80% do café comercializado no Brasil para consumo doméstico é produzido com base em cafés abaixo do tipo 8, o descarte do rebenefício. O tipo de café que os corretores negociam com as torrefações nacionais – à parte das linhas gourmet e premium, são de pontuações na base de 600 (com até 1% de impureza) a 800 defeitos (com até 2% de impurezas).

Esses grãos são considerados os cafés-base para consumo no mercado nacional – mais um exemplo de como a tabela de tipos e defeitos da COB é apenas usada como base, salienta André.

café torrado

Existem muitos questionamentos no mercado de café do Brasil quanto à eficácia do sistema de acordo com a contagem de defeitos. “Os defeitos ganham importância significativa na precificação dos cafés (…), na ausência de indicadores mais representativos a respeito de sua qualidade”, apontam os pesquisadores de “Coordenação no mercado do café brasileiro”

“O indicador ‘tipo’, a rigor, apenas fornece ao negociante uma expectativa com relação à quantidade de defeitos físicos no lote em questão”. E, ao posicionar o indicador de defeitos como a base de precificação, “o sistema classificatório cria o estigma de que o café bom, de fato, é o café ‘menos ruim'”, concluem. 

A realidade do dia a dia das operações de corretagem de café inclui cada vez menos as regras das avaliações ditadas pela COB, sustentando tal avaliação.

O sistema atual, ainda segundo Santos e Nantes, é visto como ineficaz por compradores internacionais quando comparados com outros países produtores. André também acredita nesse ponto de vista. 

É vital que o mercado nacional de café seja acolhido por um sistema normativo que reflita critérios globalizados, e prestigie o valor do trabalho do segmento produtivo do país que é o maior fornecedor de café do mundo – não só em volume, mas também em qualidade. A atualização das regulações deve ser guiada pela evolução do processo prático de demanda.

Créditos: Pixabay (grãos em secagem em terreiros e grãos torrados); Isabelle Mani (fotos de medição de peneiras, de arquivo de amostras e pesagem de grãos); Embrapa Café (beneficiamento).

Infográfico (tabela COB): Lívia Fattori Scudeller.

PDG Brasil

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