Rotas rurais: o endereço da fazenda e a cidadania na área rural
Você sabia que na maioria das regiões paulistas, e para a maior parte da população rural, não há um endereço efetivo e um roteamento pleno das vias?
Segundo o último censo agropecuário realizado pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo através da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) / Instituto de Economia Agrícola (IEA) em 2016/17, o estado possui quase 340 mil propriedades rurais com atividade econômica, e estima-se que 60 mil km de vias rurais não estão identificadas pelos sistemas abertos de roteamento, como Waze e Google Maps (é a estimativa daquilo que não consta em qualquer mapa rodoviário, municipal, estadual, federal).
Essa situação traz enormes dificuldades de atendimento e logística para os proprietários rurais, comprometendo a qualidade de vida, as atividades socioeconômicas, e o pleno exercício da cidadania que é direito de todos.
Com o propósito de trazer informação de qualidade e ferramentas que possam facilitar e transformar a vida do produtor rural, o PDG Brasil conversou com órgãos competentes sobre o importante programa Rotas Rurais, que promete solucionar muitos problemas relacionados à acessibilidade e cidadania na zona rural.
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A realidade do morador rural
Talvez muita gente não saiba por simplesmente não vivenciar o que é morar na zona rural, mas, para além de pensar no trabalho de sol a sol, muito comum das lavouras e funções rurais, existem problemas que nem se podem imaginar.
Coisas básicas, às quais nunca nos colocamos para pensar, pois naturalmente fazem parte da rotina da massa da população, como por exemplo receber uma conta de luz ou poder fazer um pedido de compra pela internet, para o morador rural pode ser uma realidade distante.
Em um vídeo de divulgação do projeto Rotas Rurais, o Governo do Estado de São Paulo traz depoimentos de moradores rurais falando sobre as dificuldades que a falta de um CEP pode acarretar:
- dificuldades ligadas à produção agrícola, como receber ou entregar produtos, sendo comum muitas vezes não ser possível sequer finalizar um pedido;
- dificuldades ligadas às questões mais pessoais, como por exemplo chamar a emergência ou comprovar o endereço para matricular uma criança na escola;
- em alguns casos é possível usar o CEP geral da cidade para correspondências e entregas, mas isso não garante que a encomenda de fato chegue (há casos de produtores que encomendam equipamentos para sua empresa ou lavoura, e a transportadora não consegue localizar a propriedade para efetuar a entrega);
- divergência de endereços por parte das empresas que emitem boletos e contas a serem pagas: a empresa elétrica considera um endereço, a empresa telefônica outro, e por aí vai;
- segurança pública, que normalmente tem um tempo de resposta maior no que diz respeito a atendimento de ocorrências policiais, de combate a incêndios e salvamentos nas regiões mais afastadas, ou seja, a área rural;
- diferentemente dos endereços urbanos, o morador rural muitas vezes não pode contar com o nome da rua onde mora, pois muitas estradas de terra sequer possuem um.

A base para a mudança
O Programa Rotas Rurais já entregou os municípios de quatro regiões: Botucatu, Mogi das Cruzes, Jales e Catanduva, em um total de 122 municípios já foram beneficiados. Mas o território paulista possui cerca de 645 municípios no total, ou seja, literalmente ainda tem muito chão para mapear.
“Ele é um case mundial, pois outros lugares do mundo como Califórnia e Austrália já tentaram implantar, porém sem sucesso. Mas em São Paulo conseguimos”, conta Celso Luis Rodrigues Vegro, diretor técnico e pesquisador científico VI pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA).
Vagner Azarias Martins, pesquisador científico do IEA, esclarece que “já sabemos que a mobilidade em espaços rurais é carente de instrumentos que viabilizem o acesso às propriedades rurais, e que o deslocamento de pessoas, produção, insumos, serviços de emergência, segurança, entregas e outros, comprometem a qualidade de vida das populações rurais.”
“Por isso o Programa busca construir instrumentos capazes de solucionar essa lacuna, tomando como apoio tecnologias da informação e de geolocalização reunidas em uma única plataforma de acesso remoto.”
“As aplicações envolvem a atribuição de endereço codificado, disponibilização de mapas logísticos e roteadores interativos que permitirão a rápida localização da propriedade rural e suas rotas de acesso.”
“Segundo o site da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, foram investidos grandes esforços científicos para que o projeto ofereça não apenas o endereço digital e roteamento das estradas da área rural, mas a construção de uma plataforma que poderá orientar tanto as pesquisas quanto a elaboração de políticas públicas para o agro paulista. A ideia é que o projeto traga uma série de ferramentas, que juntas ofereçam mais cidadania no campo.”

Programa Rotas Rurais
O programa Rotas Rurais propõe e já está realizando um mapeamento de todas as propriedades rurais, de município em município, de todas as estradas e entrada / porteira das propriedades.
Essa é uma iniciativa em parceria da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, sendo que metodologia, planejamento, coordenação e execução estão sob responsabilidade do Instituto de Economia Agrícola (IEA), ou seja, que desenvolveu a plataforma, e a CAT, que conhece o campo e se integra com a Prefeitura e os Sindicatos Rurais. Na outra ponta, a empresa Google, que forneceu sua tecnologia para então amarrar todos esses estudos.
Quem comenta sobre isso em recente entrevista é o Secretário da Agricultura do Estado de São Paulo, Itamar Borges: “passa-se então a ter identificações importantíssimas, porque você passa a possibilitar uma ferramenta que é a conclusão desse trabalho e a entrega para as Prefeituras, que junto com o Sindicato Rural e os produtores e produtoras, irá:
- denominar a estrada ou confirmar o nome que ela já possui;
- identificar com nome e número as porteiras das propriedades;
- o produtor, o vendedor, o banco, a segurança, a saúde pública, a educação, vão acessar a propriedade podendo, através do Google Maps ou do Waze, encontrar a localização correta;
- permitir a inclusão produtiva, comercial, e benefícios em todos os aspectos;
- aumentar a segurança no campo para enfrentar, reduzir e combater o crime, que tem sido muito forte em implementos, maquinários, insumos e produção.”

Como o programa Rotas Rurais funciona?
Vagner esclarece de forma simplificada que o Rotas Rurais é dividido metodologicamente em quatro partes: geolocalização, roteamento, validação e implantação. “Até o final de dezembro de 2021, o Rotas Rurais finalizou 122 municípios. O sistema de geolocalização e roteamento já foram testados e os resultados mostraram-se altamente eficientes.”
“O aplicativo é uma ferramenta de apoio ao cadastramento, mas não é a base do Programa. Ele foi desenvolvido para funcionar off-line, ou seja, o produtor pode se cadastrar e se geolocalizar por meio do aplicativo mesmo sem internet. Seus dados ficarão guardados de forma segura e serão enviados assim que o produtor acessar uma área de internet.”
Vale lembrar que a localização de proprietários e ou propriedades rurais seguirão a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a Lei de Acesso à Informação (LAI), e o aplicativo é direcionado para os proprietários rurais, que poderão fazer uso do app para acionar serviços ou enviar sua localização.
As diretrizes do programa e o formulário de adesão estão disponíveis no link da Secretaria de Agricultura e Abastecimento. E a RESOLUÇÃO SAA – 17, DE 17 DE MARÇO DE 2021– Estabelece os critérios técnicos para implementação e participação dos Municípios Paulistas através do Programa “Cidadania no Campo – Rotas Rurais”.

Mas na prática o aplicativo funciona mesmo?
Conversamos com alguns pequenos produtores, mas a maioria deles nunca tinha ouvido falar do programa. Por esse motivo, nossa equipe instalou e testou todo o processo de cadastro e mapeamento do aplicativo.
Facilmente foi localizado para baixar, e seguindo todas as orientações, sempre muito claras e objetivas, todo o processo de cadastro foi concluído com sucesso.
Mas fica uma ressalva: como o teste foi feito em aparelhos de celulares diferentes, é preciso deixar claro que um aparelho que tenha um melhor desempenho dará conta de facilitar ao aplicativo o cumprimento pleno de todas as suas funções.
O que isso significa? Que com um aparelho mais antigo e lento, não foi possível concluir o mapeamento da localização desejada, nem mesmo off-line essa etapa foi concluída. O que talvez possa ser um aspecto dificultoso para o produtor que não tiver um celular com tecnologia mais recente, e que talvez seja a realidade de muitos pequenos produtores.
Como justamente esses são os maiores interessados em se beneficiar com o programa, é de se considerar que o programa ainda está em processo de implementação. Então não desanime, pois quanto mais propriedades estiverem cadastradas, mais sentido esse trabalho todo terá, e cumprirá com maior funcionalidade seu propósito.
Se preciso for, não deixe de contatar a Ouvidoria do Governo do Estado de São Paulo, ou o Sistema Integrado de Informações ao Cidadão, ou utilizar a aba de contato disponível dentro do aplicativo.

Concluímos que o principal ganho com a implementação do Rotas Rurais no Estado será a viabilização de acesso a serviços públicos básicos e fundamentais, como saúde e segurança.
Além disso, facilitará a atuação de empresas privadas, cooperativas e associações de produtores, a logística e a distribuição de produtos agropecuários, e a melhoria da infraestrutura do campo.
Mas muita gente ainda não conhece o Programa, seus benefícios e usos. Por isso estamos aqui, cumprindo nosso papel como veículo de informação e comunicação que trabalha principalmente em prol da cadeia do café, torcendo para que esse futuro cheio de benefícios e transformação positiva da vida dos produtores e produtoras rurais, sejam eles do ramo cafeeiro ou não, seja nosso presente em breve.
Créditos: Pesquisadora Científica Katia Nachiluk e Assistente técnica de pesquisa Tereza Satiko Nishida Pinto (destaque: área rural do município de Mira Estrela / SP, no processo de validação de campo do Programa Rotas Rurais); banco de imagens (áreas rurais); print de tela de celular (interface do aplicativo Rotas Rurais).
PDG Brasil
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