O que é o frescor do café?
O que significa “café fresco”? A resposta para essa pergunta não é tão simples quanto parece. Um café fresco seria o café recém colhido? Café sem defeito? Um café sem atributos negativos? Aquele café que acabou de ser torrado? Ou café fresco é o café que acabou de ser preparado?
Desde 1982, numa publicação da Specialty Coffee Association of America (SCAA), o frescor é o tópico principal em cafés especiais. A partir de então algumas definições de frescor estão disponíveis. Illy e Viana, no livro “Espresso Coffee: The Science of Quality” (Elsevier, 2005), define o frescor do café como sendo o “desequilíbrio progressivo no perfil de aroma do café”, enquanto outras fontes definem frescor como sendo “o produto que manteve suas ‘características iniciais intactas’”.
Para saber mais sobre esse assunto, o PDG Brasil conversou com pesquisadores que atuam diretamente nesse tema.
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Como medir o frescor do café?
A percepção de frescor é bastante subjetiva do ponto de vista sensorial, segundo Samo Smrke, pesquisador do Coffee Excellence Center (Suíça), a resposta para o que é fresco não depende muito da preferência e aceitação do consumidor. Geralmente, os consumidores são bastante tolerantes ao sabor de oxidado e aceitariam o café que provadores de cafés especiais treinados considerariam velho. O desafio está na educação dos consumidores para mostrar o que representa um aroma de café fresco.
Diante dessa complexidade, definir o que significa adquirir um café fresco não é tarefa fácil. No entanto, há duas formas principais de definir o frescor do café: uma forma química – associada às mudanças no perfil de aroma do café, e uma forma física – relacionada à degaseificação do café.

Marcadores de frescor: aroma e CO2
Durante a torra, o café verde é submetido a altas temperaturas que desencadeiam uma série de reações químicas complexas que resultam na formação de compostos voláteis responsáveis pelo aroma do café. Esses aromas começam a se degradar e a evaporar, em maior ou menor intensidade, tão logo se finaliza a torra.
A partir das alterações do perfil aromático também se altera o frescor do café. Partindo dessas descobertas, foi sugerido utilizar um índice de frescor baseado nos compostos de aroma para determinar o frescor de café torrado e cápsulas de café espresso. No estudo, foi proposto utilizar uma razão entre as concentrações dos aromas, por exemplo, 2-butanona/2-metilfurano, e o aumento ou uma redução acentuada dessa razão era indicativo de perda de frescor.
A utilização de uma razão é mais eficiente do que a concentração absoluta, pois a concentração pode sofrer muita variação com o perfil de torra, composição do blend e espécies de café.
Com o crescimento da oferta dos cafés gelados, Anja Rahn, pesquisadora do Wageningen Food Safety Research, diz que o frescor dessas bebidas ainda precisa ser melhor definido pois, nesses produtos, o aroma não está mais sendo liberado do próprio grão do café, mas do extrato aquoso. Além disso, devido à baixa temperatura, o perfil de aroma extraído é diferente. É uma química totalmente diferente.
Além da formação de aroma, a torra produz uma grande quantidade de gases, nos quais mais de 80% correspondem ao CO2 (dióxido de carbono). Uma parte desse CO2 é liberado no ambiente durante e logo depois da torra, é por esse motivo que a indústria evita embalar o café imediatamente após a torra para impedir que a embalagem infle e estoure devido a contínua liberação do gás.
Para o preparo do café, a degaseificação é importante para garantir uma extração eficiente e um perfil de aroma balanceado.

O papel do CO2
A outra parte do CO2 permanece aprisionada nos poros do grão torrado e é esse CO2 que é importante para o frescor. Como ele vai, gradualmente, sendo perdido conforme o café “envelhece”, a quantidade de CO2 presente no grão é correlacionado com o frescor do café. Dr. Smrke aponta que a perda de CO2 é o método mais direto e simples para determinar o frescor do café. Isso porque essa perda de CO2 ocorre ininterruptamente, ao contrário dos aromas, cujo perfil pode ser melhor preservado quando os cafés são embalados à vácuo ou com injeção de nitrogênio e, assim, mascarar a perda de frescor.
Além do frescor, esse gás aprisionado nos poros do café é fundamental na formação e estabilidade da crema, aquela espuma que se forma na superfície do café recém-preparado, considerado por muitos como uma assinatura de cafés de alta qualidade.
Durante a extração, conforme a água flui pelos poros do café, o CO2 aprisionado é liberado na forma de bolhas que resultam na formação da crema. O volume e a estabilidade dessa crema dizem muito sobre o frescor do café. Quanto maior e mais estável é a crema, mais fresco é o café.
Há uma grande diferença na concentração de CO2 entre o grão inteiro e o moído. Em pesquisa conduzida pelo Dr. Smrke, foi mostrado que o grão torrado leva em torno de um a dois meses para sua completa degaseificação, enquanto que o café moído perde cerca de 75% de gás 80 segundos após a moagem. Ao moer, os poros do café, onde o CO2 está aprisionado, são destruídos e facilitam a perda de gás, além disso o grão fica mais exposto ao oxigênio e dessa forma mais susceptível à oxidação.
Na produção das cápsulas de café espresso, por exemplo, o café é embalado sob pressão para maior retenção do CO2 no café, diz a Dra. Rahn.

Os inimigos do frescor
Tudo o que permite a perda de aroma, seja por facilitar sua volatilização seja por oxidação, ou que acelere a degaseificação, deve ser evitado para se preservar o frescor de um café. Portanto, oxigênio, temperatura, umidade e tempo são os maiores inimigos do frescor do café.
Ao reduzir a concentração de oxigênio na atmosfera ao redor do café para 0,5%, seu tempo de vida aumenta 20 vezes. A presença do oxigênio está diretamente ligada ao aumento da reatividade dos aromas, isso quer dizer que sofrem degradação, reagem entre si ou provocam a oxidação do próprio óleo de café e formam compostos indesejáveis.
A temperatura favorece a volatilização dos aromas e a degaseificação do café, ao fornecer a energia para esses fenômenos. A taxa de reações de oxidação são muito superiores em temperaturas acima de 30°C. Ao menos teoricamente, se um café é mantido congelado a temperaturas próximas do zero absoluto, esse café seria mantido fresco indefinidamente, ao impedir perdas de aromas e manter o CO2 aprisionado dentro dos seus poros.
A presença de umidade deve ser evitada, pois a água possibilita uma maior movimentação de moléculas que pode resultar num aumento de reações oxidativas e acelerar a perda de frescor.

O que fazer para manter o frescor do café?
Conforme os estudos vão avançando a respeito do frescor, surge a demanda por alternativas inovadoras que reduzam a perda de frescor. Nesse sentido, uma opção é utilizar embalagem com válvula degaseificadora que, conforme o CO2 vai sendo liberado no interior da embalagem, expulsa o oxigênio e previne a oxidação.
Outras opções se referem ao uso das embalagens à vácuo ou com injeção de nitrogênio, em substituição ao oxigênio. Porém Dr. Smrke pontua que, nas embalagens à vácuo, o café precisa ser degaseificado por mais tempo e perde, dessa forma, mais CO2 e aroma.
A Dra. Rahn enxerga uma nova tendência nas embalagens. “Será interessante ver como a embalagem do café muda com a sustentabilidade e a economia circular. É um desafio significativo. Se a embalagem não retiver a qualidade o suficiente, as cadeias de suprimentos precisarão se tornar mais curtas.”
E acrescenta: “isso já está ocorrendo, pois os produtos são frequentemente pedidos online ou por assinatura, e os fornecedores compram café verde e torram sob demanda e em intervalos conhecidos para garantir que os consumidores recebam um café fresco”.
O congelamento do café é uma alternativa interessante e viável pois não se restringe apenas à indústria. É um método que pode ser empregado nos produtos que já foram abertos e, portanto, preservar o frescor do café.
Três dicas de ouro para garantir o frescor do café
São necessários alguns cuidados básicos para evitar a perda de aroma e de CO2 no café. Conheça alguns deles:
– O melhor café é obtido cerca de 2 a 3 dias após a torra;
– Sempre prefira a versão em grão e moa apenas logo antes do preparo;
– Armazene o café sempre em ambiente seco e frio. Se for possível, mantenha o café que não irá utilizar congelado.

Vimos aqui que o frescor do café é essencial para percebermos seus aromas e sabores em seu melhor momento. E que o aroma e a presença de CO2 no grão são os principais indicativos do frescor.
Nada se compara a um café de qualidade fresquinho, moído e preparado na hora. Por isso, quando for comprar um café, lembre-se das dicas e dos cuidados que citamos aqui para usufruir ao máximo dessa experiência única.
Créditos: Samo Smrke (comparativo dos espressos, apresentado na aula Coffee Degassing), Erik Witsoe, Madalyn Cox, Sina Asgari, Tyler Nix, Yanapi Senaud.
PDG Brasil
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