Como geisha e outras variedades de café raras ganharam popularidade no Brasil?
Não é à toa que se ouve muito por aí que o café especial é um caminho sem volta. Quando o assunto é café de alta qualidade, são inúmeras as possibilidades de sabor e perfis de bebida, graças ao grande espectro de cultivares comerciais disponíveis no mercado.
Produtores, torrefadores e baristas que atuam em especialidade procuram valorizar os atributos originais do café, bastante influenciados pela variedade do fruto. Este conjunto de características intrínsecas é determinante para sua complexidade e perfil sensorial.
Na busca por diferenciação, produtores aumentam a oferta de cafés exclusivos ao consumidor final, com variedades de café raras como Geisha, Aramosa, Japi e outras. Mas com um público cada vez mais exigente quanto à qualidade do produto, cafés raros precisam ser cultivados e torrados com cuidado para garantir experiências únicas na xícara.
Para saber mais sobre a crescente popularidade de cafés exóticos no Brasil, como eles são produzidos e que perfil sensorial podemos esperar deles, conversamos com representantes das Fazendas Dutra, produtores e torradores de café orgânico na região de São João do Manhuaçu, Minas Gerais. Eles possuem uma linha intitulada Cafés Raros & Exóticos que oferece variedades como Geisha, Pacamara e Aramosa em grãos torrados. Continue lendo para conferir o que eles compartilharam.
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O que Faz uma Variedade ser Considerada Rara
Entre as centenas de variedades e cultivares de café arábica, algumas se tornaram mundialmente conhecidas por seu excelente rendimento e alta resistência a doenças, além de um ótimo perfil de sabor. São cafés mais fáceis de serem adquiridos pelo consumidor, como Bourbon, Catuaí e Mundo Novo.
Mas há outras variedades que pedem condições muito peculiares para cultivo e exigem atenção redobrada do produtor, como altitude muito elevada, recortes específicos de temperatura, e manejo mais frequente, por exemplo. Alguns exemplos são Geisha, Asa Branca, Typica, Laurina e Pacamara.
São cafeeiros mais sensíveis às condições climáticas e muitas vezes têm resistência e produtividade menor, mas recompensam produtores e bebedores ao oferecer sabores delicados e cheios de nuances, como nenhum outro tipo de café consegue oferecer.
Por esta combinação de sensibilidade e perfil altamente complexo, são consideradas variedades exóticas. O desafio de cultivá-las tem atraído produtores que atuam com cafés especiais e querem oferecer produtos excepcionais.
“Quem está disposto a produzir estes cafés pensa em agradar as pessoas, fazer algo diferente e causar uma emoção.”, diz Ednilson Dutra, que conduz a produção de cafés nas Fazendas Dutra junto com o irmão Walter.
Para ele, o alto valor afetivo e da experiência com cafés raros estimula a produção minuciosa. “Quando você planta uma variedade que não é testada e nem comercialmente viável na região, você vai [plantar] pela satisfação, pelo modo de preparo, pelo valor simbólico”, afirma.

Como Estas Variedades Raras se Popularizaram no Brasil
O mercado de cafés especiais no Brasil teve um crescimento acentuado nos últimos 20 anos. À medida que grãos premium chegaram com mais facilidade para o consumidor, ele também teve maior acesso a informações sobre café de qualidade. Com isto, não só aumentou a apreciação por experiências únicas, mas também a sua qualificação.
“A capacidade do consumidor de identificar a qualidade melhorou muito. Antes o café era muito torrado. Hoje o consumidor, principalmente o mais jovem e com mais conhecimento, sabe valorizar o café que tem um sabor diferente.”, diz Ednilson.
Com bebedores de café destacando perfis únicos, profissionais da fazenda à xícara se sentem estimulados a focar na diversificação das opções oferecidas e aumentar a oferta deste tipo de produto. “O mais interessante é que [o consumidor] está dando apoio para o produtor que quer fazer coisas diferentes. É um incentivo para nós”, avalia Ednilson.
Walter conta que entre os cafés produzidos nas Fazendas Dutra, os exóticos começaram a chegar a partir do início dos anos 2000. Hoje as propriedades possuem as variedades Geisha, Pacamara, Aramosa, Maragogipe, Garnica, Japi, Catiguá, Kent (a primeira variedade de Arábica cultivada na Índia), e a Selection 795 (descendente das espécies arábica e liberica e também cultivada no país asiático).
Ednilson diz que produzir cafés diferenciados ajuda a difundir a cultura do café de qualidade e beneficia os admiradores de café. “O consumidor está ganhando com tudo isso, café com qualidade diferenciada, pontuação muito elevada, sabor diferente… É importante que ele tenha perfis mais complexos e mais completos para que mais pessoas tenham a oportunidade de experimentar.”
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Cafés Raros: o que Esperar na Xícara e como Torrá-los?
Se as variedades de café especial mais presentes nas fazendas já apresentam particularidades do campo à xícara, isto fica ainda mais forte quando falamos dos tipos mais raros.
Estas variedades demandam mais atenção desde o cultivo. Por isto, costumam ser colocadas em locais mais propícios para seu desenvolvimento, com micro terroirs específicos.
“Quando a gente planta [variedades raras], a gente pesquisa de onde ela é nativa pra tentar plantar em algo próximo ao local de onde ela veio, para fazer de forma que ela preserve as características da variedade.”, afirma Walter.
“Fazemos três colheitas, para pegar uma maturação bem precisa, e a variedade é plantada nas partes mais nobres da fazenda e mais propícias a produzir qualidade.”
Outro aspecto que pode fazer um café exótico de um produtor se destacar diante dos outros é o terroir. “nosso terroir é único, nosso modo de cuidar da terra, sustentável e com um olhar sobre a natureza. Nós estamos nas montanhas, com altitude elevada e natureza preservada, a planta tem a oportunidade de entregar os melhores sabores e aromas.”
Com o objetivo de levar os melhores atributos do fruto até a xícara final, os irmãos Dutra destacam a importância do cultivo orgânico, adotado na fazenda há anos: “Produzir orgânico ajuda a entregar o sabor apenas do café, preservar o sabor natural do café.”, opina Ednilson.
Entre as variedades raras, Geisha, Pacamara e Aramosa vêm se destacando em popularidade após participarem do sucesso de baristas em diversas competições. Elas estão sendo cultivadas na propriedade dos irmãos em São João do Manhuaçu, em altitudes de 1200 a 1350 metros, e compõem a linha de Cafés Raros e Exóticos torrados na própria fazenda.
Veja abaixo mais informações sobre perfil sensorial e outras particularidades de cada uma delas.
Geisha
A altitude muito elevada colabora para uma densidade mais alta em comparação com a maioria das outras variedades, o que não faz o café deixar de ser muito delicado. “Você sente a diferença na hora. Ele não é um sabor comum.”, diz Walter. Este café deve receber uma torra um pouco mais clara para valorizar suas qualidades sensoriais delicadas, mas sem deixar o café subdesenvolvido.
“O principal desafio que temos é desenvolver as notas florais do Geisha”, diz o Q-Grader das fazendas Dutra, Leonardo Rodrigues. Ele também destaca que os grãos de café Geisha têm uma característica diferente: são mais alongados do que a maioria das outras variedades, o que pede cuidados a mais para não queimá-los a hora da torra .

Pacamara
Considerada pela World Coffee Research como uma variedade que entrega xícaras excepcionais, o Pacamara é bastante sensível e tem desenvolvimento menos uniforme, mas seus grãos são muito grandes, peneira 18 acima – um dos maiores entre as variedades conhecidas. “É uma arte para torrá-lo.”, diz Walter.
Por esta característica, a torra será um pouco mais estendida que no Geisha. Leonardo explica: “Ele contém mais umidade em seu grão, com isso se torna mais pesado e este é o fato que faz com que sua torra se torne mais longa e necessite de muita atenção.”
Segundo Leonardo, o Pacamara amarelo tende a manter um sabor suave, com notas de avelã, caramelo e frutas vermelhas. Será doce e com acidez sutil. Seu perfil também poderá ser mais achocolatado e macio, com notas de doce de leite e um pouco de rapadura “O chocolate que ele lembra é um chocolate mais puro”, acrescenta Walter.
Aramosa
A variedade Aramosa é um cruzamento entre plantas da espécie Coffea arabica e Coffea Racemosa – uma espécie mais antiga do gênero Coffea, menos conhecida por não ter uso comercial. Cafés desta variedade costumam apresentar perfis aromáticos florais e menor teor de cafeína do que os grãos de Arábica mais difundidos.
Ao contrário do Pacamara, as árvores de Aramosa são mais robustas e resistentes às intempéries climáticas. Seu fruto, quando maduro, tem um vermelho muito intenso e arroxeado.
“Desenvolvemos o perfil de torra média para o Aramosa com destaques nas notas nibs de cacau e floral. É um café com corpo cremoso e finalização equilibrada.”, explica Leonardo. Você também pode esperar muita doçura, com notas de frutas vermelhas, rapadura e melado de cana.

Aprendendo com as Variedades Raras
Falamos aqui como os cafés exóticos muitas vezes exigem mais no cultivo e colheita. Com mais visitas aos talhões para manejo, precauções mais específicas com variações climáticas e maturação do fruto mais irregular, o gerenciamento do talhão pode ocupar mais tempo e demandar mais esforços do produtor.
Por outro lado, o desafio pode ser visto como oportunidade de ampliar o conhecimento no gerenciamento da fazenda e no processamento.
Walter comenta que trabalhar com variedades raras permite que eles variem as abordagens de processamento dos grãos para revelar as qualidades do café. “São nosso carro-chefe na experimentação para melhorar o perfil sensorial e sabor. Testamos ao máximo para explorar o que eles tem para entregar.”

O mercado de cafés especiais se expande no país com a oferta de variedades exóticas ao consumidor final. Apreciadores de café estão cada vez mais preocupados com qualidade, enquanto produtores e profissionais da cadeia almejam entregar a melhor experiência possível na xícara.
Mas, para isto acontecer, é preciso juntar cultivo sustentável e particularizado em excelente terroir, atenção redobrada às fragilidades da planta e uma torra que valorize os atributos únicos de cada variedade rara, para que um exótico seja, também, excepcional.
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Crédito das imagens: Fazendas Dutra
PDG Brasil
Nota: Este artigo foi desenvolvido em colaboração com Fazendas Dutra
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