6 de maio de 2020

Desvendando os Mitos do Pós-Colheita do Café

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Poucas etapas na produção do café são tão emocionantes, ou traiçoeiras, quanto o pós-colheita. A escolha do método de processamento, o tipo de colheita, o tempo de secagem e as condições de estocagem – todas elas podem ter consequências dramáticas sobre a qualidade e sabor do lote de café produzido. E, por sua vez, também impactam no preço do café.

Ao mesmo tempo, o pós-colheita pode ser caro e consumir muitos recursos quando o assunto é mão de obra, água, infra-estrutura ou equipamentos.

Os produtores precisam ponderar cuidadosamente sobre as técnicas de pós-colheita, para que possam aumentar a eficiência e a lucratividade, na qualidade e no valor do café. E por essa razão, é particularmente importante desvendar alguns mitos que foram construídos no passado.

Eu conversei com João Alberto Brando, Diretor de Exportação na Pinhalense, que projetou e construiu equipamentos para as fazendas de café, e também com Emilio Lopez, produtor de café e fundador da Cuatro M, que faz beneficiamento seco, de El Salvador, que em 2018, ficou na segunda colocação no Cup of Excellence com um café Geisha de processamento natural. Eles compartilharam comigo os mitos que eles ainda vêem muitos produtores acreditando.

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maquinario para pós-colheita do café

Um secador rotativo sendo instalado na Cuatro M, El Salvador. Crédito: Cuatro M Cafés

Pós-colheita: Por que existem tantos mitos?

O pós-colheita é uma etapa importante, às vezes confusa, e quase sempre depende de muitos outros fatores que, combinados, podem criar mitos e mal-entendidos.

O clima, as variedades, os métodos de produção, o terroir, a infraestrutura, o conhecimento, o marketing, a qualidade do café, os preços praticados e muito outros fatores afetam a escolha sobre como processar, secar e armazenar o café.

Embora o objetivo seja simples – remover os grãos de café do fruto e depois secá-los a um nível aceitável – existem muitos métodos que podem ser aplicados: úmido / lavado, natural/seco, honey process, cereja descascado, experimental… Os grãos podem ser secos ao sol, sob cobertura parcial da sombra, mecanicamente, em terreiros, em terreiros suspensos ou em uma combinação desses métodos.

Cada etapa do pós-colheita é crucial e tem um impacto – positivo ou negativo – no perfil de sabor, na qualidade e na longevidade do café.

Por isso, é crucial pararmos de repetir mitos e começar a agir com base nos fatos.

despolpador de café

Cinco despolpadores Pinhalense ECO SUPER com um separador de cerejas acoplado. Crédito: Pinhalense

Mito #1: A colheita mecânica é ruim.

É praticamente impossível separar o pós-colheita da colheita, pois a escolha de como colher o café determina o que é necessário fazer depois.

Os métodos de colheita são frequentemente divididos em dois tipos: colheita manual/seletiva e colheita mecânica.

Com a colheita manual, os trabalhadores colhem as cerejas do pé de café manualmente. Eles podem fazer isso rapidamente, retirando todas as frutas dos galhos em um método associado ao café de commoditie. Alternativamente, pode-se realizar várias empreitadas na colheita, escolhendo seletivamente apenas os frutos maduros e deixando as outros amadurecendo por mais tempo. Esse é o método de colheita é mais bem aceito pela indústria dos cafés de terceira onda.

A colheita mecânica utiliza máquinas para colher as cerejas de café com mais rapidez e eficiência. Esse tipo de colheita não é adequada para terrenos rochosos ou muito íngremes e requer uma organização cuidadosa: as árvores devem ser plantadas em fileiras e devem ter grandes lacunas entre elas. Algumas máquinas irão remover todos os frutos; outras podem ser programadas para remover apenas os mais pesados e maduros.

Além disso, alguns produtores usarão primeiro as colheitadeiras mecânicas nas copas das árvores, onde as cerejas amadurecem mais cedo em função da sombra reduzida, antes de passar para os ramos intermediários e, finalmente, para os ramos inferiores.

colheitadeira de café

Um Pinhalense P1000 em uso em uma fazenda. Crédito: Pinhalense

Então, a colheita mecânica é sempre ruim?

João Alberto comenta: “O benefício da colheita mecânica é a produtividade da própria colheita. Uma máquina grande poderia substituir algo em torno de 200 trabalhadores. Os ganhos são impressionantes porque a redução de custos na colheita é incrível, e esse é o grande benefício da colheita mecanizada.”

Mas não se trata apenas de economizar. Em uma grande propriedade, tentar colher tudo manualmente levaria tanto tempo que muitos frutos iriam amadurecer e apodrecer nos galhos antes que os trabalhadores chegassem a eles.

Também é possível mirar nas cerejas maduras com colheita mecânica, ajustando as configurações nas máquinas ou prestando atenção em quais áreas da fazenda estão amadurecendo em determinado momento.

Além disso, a triagem do pós-colheita pode remover as cerejas sub-maduras e super-maduras de uma colheita. Por exemplo, a lavadora e separadora de café LSC Pinhalense separa as cerejas maduras e cerejas passa. Da mesma forma, as máquinas podem remover o café verde. (João Alberto ressalta que isso também pode ser feito quando a colheita é realizada por derriça)

Isso é útil, pois significa que os lotes separados podem ser processados individualmente, ao invés de as cerejas verdes serem descartadas. João Alberto explica que isso permite que os produtores “acessem diferentes mercados”, permitindo que eles aumentem sua renda.

Emilio vê a colheita mecânica como parte do futuro da indústria cafeeira. “Na América Central, já existem colheitadeiras mecânicas”, ele comenta. Ainda não nos cafés especiais. Em outras áreas, devido à terra, será uma realidade em cinco anos. ”

separadora de café no pós-colheita

A lavadora e separadora de café Pinhalense LSC-05PX remove as cerejas maduras e com grãos defeituosos, também conhecidas como “bóia”, porque seu baixo peso e bolsas de ar os farão flutuar na água. Crédito: Pinhalense

Mito #2: A remoção mecânica da mucilagem é ruim para qualidade

Depois que o café for colhido e separado, o próximo passo é remover a polpa do fruto dos grãos – supondo que você esteja utilizando o processamento lavado/úmido, honey ou cereja descascado, é claro. O processamento natural exigiria que o café ainda fosse seco nas cerejas.

No processamento lavado/úmido, a mucilagem da cereja é notoriamente difícil de remover. Tanques de fermentação são um método comum; no entanto, também podem ser usados removedores mecânicos, como o Pinhalense DMPE.

Explore também Como Garantir Consistência na Fermentação e Processamento do Café

Então, a remoção mecânica da mucilagem é realmente ruim?

João Alberto diz que os produtores usam removedores mecânicos de mucilagem para garantir a homogeneidade, reduzir o uso de água e limitar a perda de peso nos grãos. Segundo a associação nacional de café da Guatemala Anacafé, o café pode perder 1% de seu peso após 14 horas no tanque de fermentação, 2% após 20 horas e 6% após 36 horas. Consequentemente, isso pode afetar os rendimentos do produtor.

Enquanto alguns temem que o uso de removedores mecânicos de mucilagem possa impactar a qualidade, João Alberto me garante que internamente, os cuppings cegos da Pinhalense não mostraram diferenças na pontuação final da xícara.

“Muitos clientes usam os dois métodos”, diz João Alberto. “[Eles começam com] tanques de fermentação e finalizam o processo com um removedor de mucilagem mecânico … Não pretendemos fazer com que os métodos mecânicos substituam todas as inovações ou métodos de processamento, mas pretendemos fornecer uma alternativa para o produtor”.

pós-colheita do café

Os grãos de café passam pelo DMPE Pinhalense para remover sua mucilagem mecanicamente no moinho úmido da Cuatro M, El Salvador. Crédito: Cuatro M Cafés

Mito #3: Café lavado é ruim para o meio ambiente

Enquanto os cafés úmidos/lavados são celebrados por seus perfis limpos, que permitem que sabores complexos e a acidez brilhem, uma coisa pela qual não é tão comemorado é o consumo de água. A Federação Nacional dos Produtores de Café da Colômbia (FNC) calculou que são necessários 40 litros/quilos de água para obter apenas um quilo de café em pergaminho seco.

E aí está como a água poluída é descartada. Em alguns casos, essa água entra nos sistemas locais de água, carregando todos os compostos das cerejas do café, perturbando o ecossistema local.

Isso levou à ideia simplificada de que o processamento lavado é ruim para o meio ambiente, enquanto o processamento natural / a seco é a opção mais ecológica.

No entanto, isso nem sempre precisa ser verdade. Sim, o processamento lavado pode ter um impacto negativo no meio ambiente – mas existem maneiras de combater isso.

Então, o processamento lavado é sempre ruim para o meio ambiente?

Tradicionalmente, a água seria usada para soltar a polpa do café, para fermentá-lo em tanques e também para transportar as cerejas pelos canais e, ao fazê-lo, separar as defeituosas. Isso é possível porque os defeituosos costumam flutuar na água, pois os grãos de café não foram desenvolvidos adequadamente. As cerejas são mais leves e têm bolsões de ar.

No entanto, a tecnologia vem sendo desenvolvida, particularmente na última década, para fornecer alternativas aos produtores, João Alberto comenta.

“Existem maneiras de reduzir a água usada no transporte de café”, diz ele. “… Nossa sugestão é que não usemos água para transporte, por isso é melhor usar um elevador ou um transportador em rosca tubular”.

Uma lavadora e separadora mecânica de café, ele acrescenta, precisa de apenas um tanque de água por dia. E, dependendo do despolpador mecânico, ele usará zero ou muito pouca água.

“A tecnologia foi desenvolvida muito nesse sentido, para o processamento de café lavado. Usando a tecnologia certa, o uso da água é muito menor, e eu não diria que é uma preocupação hoje em dia”, diz João Alberto. De fato, ele me diz que usar uma combinação das máquinas da Pinhalense pode significar que são necessários apenas 250 ml de água por quilo de café cereja.

E Emilio, que começou apenas processando cafés naturais e honey agora também processa lotes lavados. Ele comenta que essa nova tecnologia permite que use apenas 20% da água que utilizaria se processasse de uma maneira mais tradicional – e também, ele acrescenta, menos eletricidade.

pinhalense eco super

O Pinhalense ECO SUPER, um equipamento desenvolvido para a despolpa de cerejas de café com uso mínimo de água. Crédito: Pinhalense

Mito# 4: A secagem mecânica reduz a qualidade

A fase de secagem tem um impacto tão crítico na qualidade do café quanto na colheita e processamento. Isso afeta o sabor, o aroma, a longevidade e muito mais do café. No pior dos casos, a secagem inconsistente ou excessivamente lenta pode levar a mofo e perda de colheitas.

Os métodos de secagem incluem pátios, terreiros suspenso e secadores mecânicos. A indústria de cafés especiais normalmente prefere terreiro suspenso. Ao mesmo tempo, em ambientes úmidos, eles podem não ser adequados. É importante que o café não seque muito lentamente.

Por outro lado, algumas pessoas argumentam que os secadores mecânicos podem secar o café muito rapidamente, usando temperaturas tão altas que prejudicam a qualidade do grão. Embora um produtor possa optar por secar o café a uma temperatura razoável, o argumento é de que é impossível saber qual temperatura o produtor usou.

Então, a secagem mecânica sempre reduz a qualidade?

João Alberto reconhece esses riscos. Ele comenta que “expor os grãos por mais tempo do que deveriam estar na secadora e a temperaturas excessivas” pode causar problemas. De fato, altas temperaturas podem ser um problema, não importa o método de secagem.

No entanto, ele diz: “Existem maneiras de secar o café mecanicamente sem afetar sua qualidade … O secador mecânico deve ter um bom controle de temperatura, para que você possa controlar a temperatura da massa de café e configurá-lo para não exceder certos parâmetros, para [que fique a] apenas 40ºC [104ºF]. ”

Ele acrescenta comentando que o movimento contínuo dos grãos é importante, pois garante uniformidade durante a secagem. É por isso que os produtores revolvem seus grãos periodicamente ao usar pátios ou terreiros suspensos. Com um secador rotativo, no entanto, o café se move constantemente dentro do tambor. Ele argumenta que, na verdade, isso é ainda melhor.

No Cuatro M, por exemplo, Emilio usa secadores mecânicos, pátios e terreiros suspensos, “de acordo com as necessidades do cliente”. Ele diz que os secadores rotativos permitem controlar a temperatura, o fluxo de ar e o tempo de secagem, além de proporcionar um retorno mais rápido do investimento.

Em outras palavras, assim como em terreiros suspensos e pátios, não se trata apenas da tecnologia – mas também sobre como você a utiliza.

separando cerejas de café

Cerejas de café sendo processadas na Finca El Manzano, El Salvador. Crédito: Cuatro M Cafés

Escolher como cultivar, colher, processar e secar café não é uma decisão fácil. Há muitos fatores que precisam ser considerados, desde as demandas do mercado até o clima local e os recursos disponíveis. Mas o importante é que os produtores possam escolher o melhor método para sua fazenda e seus objetivos de negócios – e isso significa ter acesso a informações precisas, ao invés de mitos.

Traduzido por Daniel Teixeira

PDG Brasil

Nota: Este artigo foi originalmente patrocinado pela Pinhalense

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